terça-feira, 19 de outubro de 2010

Trânsfugas


Meu saudoso pai, o capitão Accioly, fazia um julgamento seco sobre os políticos que mudavam de lado - vivíamos então a época da "Gloriosa", onde o mundo era bem mais preto e branco que o de hoje. Para ele, esses indivíduos tinham um só nome:
- Trânsfugas.
Assim, ele encerrava o assunto quando a conversa girava em torno de um dessas pessoas que militam anos e anos num partido, conquistam a confiança do eleitor, e depois, sem mais nem menos, abandonam o barco e vão de mala e cuia para uma nova casa, geralmente maior e mais bonita.
E não adiantava nada o sujeito gastar o tempo que fosse explicando porque fez o que fez. O capitão Accioly simplesmente não ouvia as justificativas: ancorado em sua rígida formação militar, ele punha uma pedra em cima da discussão com o seu "trânsfuga".
Claro que hoje, muitos anos depois de ouví-lo decretar várias vezes sua sentença sobre o caráter de determinados indivíduos, com o país mudado para melhor, já não posso concordar inteiramente com juízos desse tipo.
Aprendi que o mundo não é em preto e branco e assim comporta sutis graduações que, se não absolvem completamente os tipos que se esgueiram entre ideologias aparentemente díspares, pelo menos nos fazem entender essas ações evasivas.
Resolvi escrever essa singela crônica depois de ler que o deputado e ex-guerrilheiro Fernando Gabeira fez uma apaixonada defesa da candidatura Serra, ratificando uma posição já conhecida no primeiro turno - embora ele, na ocasião, como postulante ao cargo de governador fluminense, estivesse vestido de verde.
Nas palavras usadas para justificar a sua escolha, Gabeira afirmou que Serra tem um projeto para unir o país, embora todas as evidências de sua campanha movida pelo ódio e preconceito indiquem o contrário.
Talvez a gente nunca saiba os motivos reais que levaram o ex-jornalista a tomar tal decisão, que certamente chocou muitos de seus eleitores mais antigos, aqueles que viam na sua figura um quê da rebeldia e inconformismo que marcou uma geração.
Para elas, Gabeira era um símbolo. Para mim, que ouço de quando em quando a voz firme e confiável do capitão Accioly, ele é apenas mais um trânsfuga.
Como muitos outros que passeiam por aí exibindo seus trajes novos e suas almas vendidas.

2 comentários:

  1. Trânsfugas.
    Já me decepcionei bastante com esses trânsfugas: Erundina, Plínio, Sonsinha etc, ainda bem que o mundo não é em preto e branco.

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  2. Nesse time tem lugar também para um certo Flávio Arns, que se elegeu senador pelo PT e agora anda de mão dadas com o Serra.
    E ainda usa, ou autoriza usar, o nome da tia (Zilda Arns) Na fétida campanha do Serra abaixo...

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