sexta-feira, 10 de abril de 2015

O trabalhador, esse herói

A aprovação, pela Câmara dos Deputados, do projeto que libera geral a terceirização no trabalho, é uma desgraça para o país.

Provoca um retrocesso sem precedentes nas relações trabalhistas.

O lado mais forte, o capital, se fortalece ainda mais; o mais fraco, o trabalho, fica ainda mais fraco, praticamente sem nenhum poder de barganha.

Se o projeto virar lei, em pouco tempo a imensa maioria dos trabalhadores hoje contratados pela CLT, e portanto com vários direitos assegurados, vão sofrer as consequências desse descalabro: serão demitidos e depois readmitidos, com salários mais baixos, pelas empresas terceirizadas. 

Ou então, no caso de trabalhadores mais qualificados, serão obrigados a abrir empresas para trabalhar como "PJ" - pessoa jurídica.

Só quem não tem a menor ideia de como é a legislação trabalhista brasileira pode achar que esse projeto de lei beneficia as pessoas.

Foi feito exclusivamente para que os empresários lucrem ainda mais, sob o pretexto de que a CLT onera as companhias, de que cada empregado contratado custa o dobro para elas, de que, dessa forma, elas não são competitivas.

Tudo papo furado.

A CLT existe há quase um século e nem por isso as empresas brasileiras deixaram de lucrar, de crescer e de enriquecer seus donos.

As empresas, além da busca do lucro, têm uma função social.

Devem prover bens e serviços para a sociedade e, por meio da remuneração de seus funcionários, não só garantir a sua subsistência, mas torná-los parte integrante da cadeia produtiva, como consumidores dos bens e serviços produzidos por eles. 

Quanto mais empregos qualificados houver, quanto maior for o rendimento médio dos assalariados, melhor para o país - a roda da economia poderá girar mais livremente, beneficiando a todos.

Claro que há problemas na legislação trabalhista.

Claro que os terceirizados precisam de uma lei que regulamente sua atividade.

O que a Câmara aprovou, porém, nada mais é que um crime contra os trabalhadores.

É algo que beneficia, talvez, alguns milhares de empresários, que deverão embolsar a parte que destinavam aos direitos trabalhistas, e empobrece, dificulta a vida e compromete o bem-estar de milhões de pessoas.

É um atalho para levar o Brasil à barbárie, como querem alguns setores da sociedade.

A diferença entre ser um trabalhador contratado pela CLT e um terceirizado é monstruosa.

Durante três anos fui obrigado a trabalhar como "PJ" num badalado jornal, que havia, pouco antes, levado um tranco financeiro.

Foi um horror.

Foram três sem FGTS, sem 13º salário, sem o pagamento das férias.

Foram três anos arcando integralmente a Previdência Social e o plano de saúde.

Sem contar os tributos recolhidos pela minha "empresa" - é, era obrigado a ter uma "empresa"...

E pagar um contador para cuidar de toda a burocracia. 

Nem vou falar sobre a humilhação de ser considerado um trabalhador de segunda categoria, embora estivesse fazendo o mesmo que muitos outros naquela redação. 

Depois de passar por esse inferno, fui finalmente contratado.

Carteira assinada e tudo.

Passei, então, pela lógica patronal, a ser um privilegiado, pois, afinal, além do emprego, podia desfrutar de todas as "regalias" proporcionadas pela legislação.

Pena que isso não durou muito, pois num belo dia fui abruptamente levado pelo passaralho para outras plagas. 

Vida de trabalhador, realmente não é fácil no Brasil.

2 comentários:

  1. Só pra complementar: um contador cobra, em geral, R$ 788 (um salário mínimo) para fazer a escrita de um PJ jornalista. Este, normalmente ex-contratado e depois transformado em PJ disfarçado, emite uma Nota Fiscal por mês. Se for disputado pelo mercado, emitirá mais de uma, ou seja, vai dar um pouco mais de trabalho ao contador.
    A carga fiscal na cidade de São Paulo para PJ que presta os chamados serviços jornalísticos fica em torno de16,4%, considerados os tributos federais e os municipais. No novo simples, PJ jornalista continua pagando o mesmo.
    A tributação do IR e da CSLL pelo sistema de lucro presumido é de 32% sobre o faturamento.
    Sobre isso, o PJ precavido ainda devei recolher pro INSS, no mínimo uns R$ 300 por mês.
    E, pra completar, o seguro saúde é, via de regra, todo pago pelo "beneficiário".
    Faça as contas e veja que vantagens o trabalhador terá com a terceirização das atividades fim - além de não ter FGTS nem garantia de que o contratante bonzinho vai lhe dar férias e 13º, embutidos no cachê mensal...


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  2. Passei pelos mesmos problemas por você relatados, por mais de 20 anos. Hoje minha filha aguarda receber na justiça do trabalho, sua rescisão de contrato por uma terceirizada que faliu. Sera que vai receber? Ja espera ha tres anos.

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