quinta-feira, 27 de setembro de 2012
Supremo barraco
Juízes da mais alta corte, mostra esse julgamento do tal mensalão, são homens absolutamente comuns, cheios de defeitos como todos os outros mortais, embora caprichem no visual para se diferenciar da massa - aquela capinha preta que eles usam não é o máximo?
Na sessão de quarta-feira eles capricharam na demonstração explícita de que são seres humanos e não super-homens imaculados, plenos de sabedoria, que pairam quilômetros acima da mediocridade cotidiana dos milhões de brasileiros que imploram Justiça para reparar as iniquidades deste contínuo labutar que se chama vida.
Quem ainda tem dúvidas sobre a falibilidade desses indivíduos, quem ainda acha que o Supremo Tribunal Federal é o último bastião da racionalidade nesta Terra, a torre onde se encastelam os mais sábios entre os sábios, os justos entre os justos, deveria ler a matéria que o "Valor" publica hoje, de autoria dos repórteres Juliano Basile, Maíra Magro e Caio Junqueira.
Ela vai aí abaixo, na íntegra. O leitor pode notar que o barraco de quarta-feira no Supremo, na substância, não se diferencia muito de qualquer discussão de boteco sobre, por exemplo, um Palmeiras x Corinthians da vida.
Foi gol?
Estava impedido?
Ora, vá se catar...
Barbosa eleva o tom contra Lewandowski
Bastou o revisor do processo do mensalão, ministro Ricardo Lewandowski, pedir novas absolvições, ontem, para o relator, ministro Joaquim Barbosa, ficar indignado e o tom voltar a subir no Supremo Tribunal Federal (STF). Ambos protagonizaram várias discussões tensas na 28ª sessão e o julgamento ainda não chegou à metade. A Corte Suprema está analisando a primeira parte do quarto dos sete itens da Ação Penal nº 470 - o que trata das acusações de envio de dinheiro para parlamentares votarem a favor do governo. O primeiro embate se deu logo após Lewandowski absolver o ex-líder do PMDB José Borba por lavagem de dinheiro. O ex-deputado recebeu R$ 200 mil no Banco Rural das mãos de Simone Vasconcellos, uma ex-funcionária do publicitário Marcos Valério. O revisor condenou Borba por corrupção, mas alegou que não viu crime antecedente para punir Borba por lavagem de dinheiro. "É preciso demonstrar que o réu sabia, ou pelo menos deveria saber de forma mais apurada, que esse dinheiro era proveniente de crime contra a administração pública ou crime contra o sistema financeiro", justificou Lewandowski.
A absolvição irritou Joaquim Barbosa. "Está claro que o dinheiro vinha de um empresário que tinha contratos com o governo e cujo modo de agir era conhecido de todos. Havia toda uma engrenagem para essa distribuição de dinheiro que era conhecida de todos", disse o relator. "Eu não acho que era tão evidente", rebateu o revisor. "Nós não podemos partir de uma pressuposição de que era tudo lógico, de que havia um núcleo", continuou. "Mas nós estamos há dois meses julgando a mesma coisa", afirmou Barbosa.
Em seguida, o relator pediu para o revisor distribuir seu voto no início da sessão, "como eu tenho feito, porque facilita o debate". "Ministro, não é praxe e meu voto está num constante fazer e refazer", respondeu Lewandowski. "Não posso fazê-lo." Barbosa apelou, então, à necessidade de transparência, o que fez o ministro Marco Aurélio Mello entrar na discussão: "Mas todos nós atuamos em público e com transparência". "Eu não estou dizendo o contrário", esclareceu Barbosa. "Mas vossa excelência insinuou, contrariado por não ter tido o voto por escrito do revisor", retrucou Marco Aurélio. "É preciso aceitar a diversidade", pediu. Em seguida, Barbosa disse que teria de fazer uma réplica e Lewandowski protestou: "Vossa Excelência quer fazer uma réplica antes de eu terminar o meu voto?"
Houve outro embate quando Lewandowski condenou o presidente do PTB, Roberto Jefferson, por corrupção, alegando que ele recebeu R$ 4 milhões de Marcos Valério, mas absolveu-o do crime de lavagem de dinheiro. O revisor afirmou que parte do dinheiro foi destinada para uma amante do então presidente do PTB, José Carlos Martinez, e não para a compra de votos, como alega a acusação da Procuradoria-Geral da República (PGR). "O que me interessa disso tudo é o fim, a corrupção para obter um apoio privado", disse Barbosa. Ele repreendeu o revisor por utilizar fatos da vida pessoal dos envolvidos no mensalão. "Se a vida pessoal não tivesse relevância, a Geiza [Dias] e a Ayanna [Tenório] estariam condenadas", respondeu Lewandowski, lembrando que ambas foram absolvidas pelo plenário da Corte.
O relator chegou a acusar o revisor de fazer "vista grossa dos autos", quando ele absolveu o ex-primeiro secretário do PTB Emerson Palmieri. "Vossa Excelência leu os depoimentos de Marcos Valério e Simone Vasconcelos. Eles dizem taxativamente que ele [Palmieri] recebeu [dinheiro do esquema]. Ele está na lista feita por Valério e confirmada pelo Delúbio [Soares, ex-tesoureiro do PT]", disse Joaquim Barbosa. "Se vossa excelência não admite a controvérsia, deveria propor que o tribunal abolisse a figura do revisor", reclamou Lewandowski.
O presidente da Corte, ministro Carlos Ayres Britto, tentou por diversas vezes acalmar os ânimos, dizendo que "os mesmos fatos comportam interpretações diferenciadas". "É uma visão, excelência", disse Ayres Britto a Joaquim Barbosa. "Se o ministro Lewandowski estivesse negando a existência do fato, aí seria grave", continuou. Mas Barbosa subiu o tom em diversas vezes. "Nós, como ministros do Supremo, não podemos fazer vista grossa", disse o relator. "Cuidado com a palavra, excelência", advertiu Marco Aurélio Mello. "Nós estamos atuando de forma correta, ministro. Policie a sua linguagem. Não há campo para ficar agredindo o colega", completou. Barbosa se defendeu: "Estou usando muito bem o vernáculo. Mas estou usando sem hipocrisia." Ricardo Lewandowski fez, então, uma pergunta provocativa: "Vossa excelência está dizendo que estou fazendo uma leitura deliberadamente equivocada dos autos ou que quero induzir a erro meus pares? É isso que vossa excelência quer dizer? Diga explicitamente." "É absolutamente heterodoxo um ministro ficar medindo os votos do revisor para replicar no mesmo tamanho", alfinetou Barbosa. Lewandowski ameaçou interromper a leitura de seu voto: "Estou estupefato, perplexo, não estou nem entendendo o que vossa excelência está dizendo. Não sei nem se tem condições de prosseguir, mas farei um esforço". Apesar da ameaça, Lewandowski continuou o voto e pediu novas absolvições, o que irritou Barbosa ainda mais.
Outro ponto de debate foi a viagem de Marcos Valério, de seu advogado Rogério Tolentino e de Emerson Palmieri para tratar de negócios envolvendo a Portugal Telecom. Lewandowski disse que o motivo da viagem foi "tratar de um processo que aconteceu muito antes, as privatizações". Joaquim Barbosa estava fora do plenário, por causa das dores nas costas, mas voltou para contestar Lewandowski. "Vossa excelência diz que foram cuidar da privatização. Eu pergunto: algum desse senhores tinham representação do Estado brasileiro?" "Vossa excelência está perguntado a mim ou é uma pergunta retórica?", retrucou o revisor do processo. "Eu gostaria de ser como vossa excelência, que só tem certezas", ironizou Ricardo Lewandowski. "Eu vou precisar de um momento para falar dessa viagem, pois é muito esdrúxula", continuou o relator. "Concordo com vossa excelência. É tudo muito esdrúxulo", concluiu Lewandowski.
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