terça-feira, 24 de abril de 2012

A ética do boimate


Como não pôde descontar em quem queria, a revista Veja resolveu dar o troco atacando os baixinhos.
A capa de sua última edição por pouco não se ombreia (ops!) à sensacional matéria sobre o boimate, o cruzamento do boi com o tomate, furo mundial editado anos atrás, que tornou a publicação ainda mais famosa e respeitada pelo público em geral, reportagem que deve ter exigido um esforço considerável de seu autor, uma checagem e rechecagem infindável de dados, e acima de tudo, muito respeito a seus leitores.
Se já tinha uma legião de gente que não pode nem ouvir o seu nome, a revista, com esse besteirol de agora certamente vai ganhar mais um tanto de desafetos, graças ao preconceito explícito contra sei lá quantos por cento da população brasileira que não atinge os padrões de altura que Veja julga ideais.
O assunto de capa é tão palpitante que deve ser devido a ele que o diretor de redação, Eurípedes Alcântara, abriu o editorial "Ética Jornalística: uma reflexão permanente", publicado apenas no site da revista, dizendo que "VEJA nunca permitiu que suas páginas fossem usadas para outro fim que não a busca do interesse público".
O problema é que, quem se dispõe a ler o restante do artigo, vai notar que o jornalista não estava se referindo aos baixinhos, o alvo da vez da fúria moralizadora da publicação.
O que ele tenta, na verdade, explicar é como a revista é feita, que critérios jornalísticos utiliza e o modus operandi de seus valorosos e leais funcionários, talvez motivado pelo cipoal de denúncias que enreda a publicação desde que o caso Demóstenes/Cachoeira veio à luz.
No mundo ideal, aquele em que a sujeira e a maldade, os crimes e o cinismo, a corrupção e a hipocrisia. não têm lugar, num mundo em que nada de ruim acontece, talvez toda a sua peroração sobre ética fosse entendida como um depoimento absolutamente crível.
Neste mundo, porém, em que as imperfeições do ser humano se revelam a cada instante como a essência de sua atividade, as palavras do sr. diretor de redação sobre princípios éticos e coisa e tal soam absolutamente vãs e sem sentido.
Afinal, para que esse blá-blá-blá se, como a própria capa de Veja mostra, a evolução "tecnofísica" explica "por que as pessoas mais altas são mais saudáveis e tendem a ser mais bem-sucedidas", e essa revelação apaga toda as estrepulias do bando de Demóstenes/Cachoeira?
Não seria melhor para a revista, carro-chefe de uma megaempresa de comunicação, recorrer a essa tal de "tecnofísíca"  para pautar o seu comportamento daqui para adiante, sempre com o princípio de sua chamada de capa em mente?
"As pessoas altas tendem a ser mais bem-sucedidas"...
Pensando bem, esse seria um início bem melhor para o editorial do sr. diretor de redação do que palavras tão sem sentido como "VEJA nunca permitiu que suas páginas fossem usadas para outro fim que não a busca do interesse público".
Ai que saudades do boimate...

Um comentário:

  1. Por essas e outras, faço questão de não ler a Veja, desde a abominável cobertura dos ataques às torres de NY.
    E nem por dever de ofício mudo minha decisão.
    CZ

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