domingo, 22 de janeiro de 2012

Sherlocks


O mais famoso personagem da literatura policial, Sherlock Holmes, notável criação do escocês Arthur Conan Doyle, já apareceu sei lá quantas vezes em filmes para o cinema ou televisão. De certa forma, Sherlock não foi apenas ele, mas muitos outros, de personalidades as mais variadas, nessas versões de seus contos e romances.
Depois de certo tempo longe do grande público ele voltou à telona interpretado por Robert Downey Jr., com direção de Guy Ritchie, o ex-marido de Madonna, trazendo muitos efeitos especiais, lutas, explosões e sequências em câmera lenta.
O primeiro Sherlock repaginado fez tanto sucesso que os seus produtores resolveram repetir a fórmula e tudo indica que este "Sherlock Holmes 2 - O Jogo de Sombras" que está nos cinemas terá outra continuação - porque assim manda a indústria do cinema controlada pelos USA.
Para quem gosta desse estilo blockbuster, de ação contínua, cortes rápidos, cenários hiperrealistas e fotografia saturada, este novo filme deve ser um prato cheio. Vi o primeiro na televisão e até que achei divertido, mas não mais que isso. Pouco restou do personagem original, aquele sujeito fleugmático, inteiramente cerebral, que evitava qualquer atividade física desnecessária - e sempre derrotava os mais pérfidos vilões.
Mas os fãs verdadeiros do maior detetive de todos os tempos, que até podem aceitar esse Sherlock chegado numa pancadaria, certamente vão preferir a versão que a BBC produziu recentemente, criada por Steven Moffat e Mark Gattis, também lançada em DVD no Brasil. Até o momento foram levados ao ar três episódios, primorosos, com uma particularidade que torna a série ainda mais atrativa: este Sherlock cínico e misógino vive na Londres contemporânea, usa celular e computador, anda em carros modernos, e seu amigo, o dr. Watson, é um veterano da guerra do Afeganistão.
O herói é interpretado por Benedict Cumberbatch e o seu companheiro de aventuras por Martin Freeman. Os dois atores esbanjam talento e dão aos seus personagens as nuances expressivas que diferenciam as produções medíocres das superlativas. As histórias, como as do Sherlock de Conan Doyle, prendem a atenção do espectador desde o início, são inteligentes e bem narradas e enfatizam o método dedutivo de investigação do detetive, capaz de, a partir de um simples detalhe que observa, construir uma teoria, que, quase sempre, se comprova verdadeira.
Claro que a produção da BBC é bem mais modesta em recursos que as dirigidas por Guy Ritchie. E até por isso seus méritos ficam mais evidentes - que diferença que faz assistir a um filme com bons atores e bons diálogos! Que falta fazem ao cinema intérpretes com o carisma de um Gassman, de um Mastroianni, Sordi, Tognazzi, de um Noiret, Fernandel, Piccoli, Serrault, do extraordinário Michel Simon...
Felizmente ainda existem hoje alguns atores que honram esses antecessores notáveis, como, por exemplo, o francês Gérard Depardieu, uma força da natureza, que se move em frente da câmera como se estivesse tomando um cafezinho ou simplesmente respirando.
Fiquei convencido de seu extraordinário talento desde que vi o "Cyrano" de Jean-Paul Rappeneau, há uns 20 anos. Ontem, ao assistir ao sensível, inspirado e belo "Minhas Tardes com Margueritte", de Jean Becker, onde ele contracena com a quase centenária Gisèle Casadesus, não tive mais dúvidas de que o cinema é mesmo uma grande arte, desde que feito com emoção, a mesma emoção que move os seres humanos em seus atos, sejam eles heroicos ou insensatos, trágicos ou cômicos, grandes ou pequenos. O resto são meros detalhes.

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