Alckmin: zelo pela lei. Qual lei? Foto: Antonio Cruz/ABr |
Com as empresas, por exemplo é assim: se a lei é boa para elas, é cumprida; se não, é ignorada.
No Estadão, me lembro, houve uma época em que os jornalistas "batiam" o ponto e tudo corria bem até que os demitidos resolveram entrar na Justiça para cobrar as horas extras, evidentemente não pagas pelo empregador. Aí, acabou-se com o cartão de ponto - e isso é proibido por lei.
Outro caso do não cumprimento de uma lei: a Folha sempre ignorou a profissão de jornalista, mesmo quando ela era regulamentada, ou seja, quando ela existia. Fazia questão de contratar quem não tinha diploma - o que era proibido pela lei.
E por aí vai.
Por essas e outras é que a declaração do governador paulista, Geraldo Alckmin, de que não foi ele que determinou a reintegração de posse da área do Pinheirinho por um exército de 1.800 policiais militares, com tiros, explosões de bombas, feridos, pancadaria e tudo mais o que só a centenária corporação é capaz de fazer, soa, no mínimo, como uma grande hipocrisia.
“Quem decide é a Justiça. A Justiça decide, e o oficial de Justiça vai executar a decisão judicial. Quando ela não é cumprida, a Justiça requisita a polícia. É a Polícia Judiciária. O governo não tem esse condão de atendo ou não atendo [os pedidos de ceder a polícia]. Senão, não precisaria ter Justiça”, disse o governador naquele seu tom de voz que parece o de um autômato de filme antigo de ficção científica.
Ele tem razão se as coisas deste mundo fossem em branco e preto.
Mas como são coloridas, cheias de nuances, o que disse para justificar o absurdo da violência policial e a monstruosidade que foi jogar na rua 9 mil pessoas que haviam constituído no local, há oito anos, uma comunidade pacífica e ordeira, que respeitava as leis, é apenas mais uma declaração cínica que se soma a tantas outras de sua autoria.
O governador sabe mais que todos nós que muitas leis, boas leis, leis que foram feitas para diminuir a injustiça e a desigualdade entre os homens, não são cumpridas em seu Estado.
O governador, tão zeloso pelo cumprimento das leis, sabe perfeitamente que, todos os dias, só para dar um exemplo, os jornais que tanto prezam a sua administração e competência noticiam que a sua polícia prende, espanca e mata sem razão, invade casas sem mandado judicial, humilha pobres e pretos, tortura suspeitos, extorque bandidos, faz coisas que deveriam deixar atônitos qualquer cristão - e especialmente ele, um católico tão fervoroso.
O governador - e todos esses que evocam o cumprimento da lei para dar guarida a essa barbaridade que foi a invasão do Pinheirinho e a expulsão de seus moradores - sabe muito bem que as leis são para serem cumpridas - todas as leis, inclusive e principalmente a Carta Magna, a nossa Constituição, que explicita, entre vários outros, o direito à moradia.
Pois é, governador, cumpra a lei!
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