segunda-feira, 1 de agosto de 2011

A vez das domésticas


O Brasil é um dos países que mais empregam trabalhadores domésticos e também um dos que mais avançaram nos últimos anos na instituição de direitos para a categoria, uma das menos protegidas pelo Estado. Segundo a presidente da Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas (Fenatrad), Creuza Maria Oliveira, o país poderá ser pioneiro numa questão histórica, como a primeira nação entre as 183 integrantes da Organização Internacional do Trabalho (OIT) a ratificar a Convenção sobre o Trabalho Decente para Trabalhadores Domésticos.
Aprovada em junho, em Genebra – com uma folgada maioria de 396 votos a favor, 16 contrários e 65 abstenções – a convenção objetiva melhorar as condições de trabalho dos 53 milhões de trabalhadores domésticos em todo o mundo.
No Brasil, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 478/2010 que ampliará os benefícios das demais categorias também para os domésticos já foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados. Agora ela aguarda a criação de uma comissão especial na casa parlamentar para a continuação dos debates. "Está se falando numa aprovação até o fim do ano", disse Creuza. "Mas sabemos que nem todo mundo dentro do Congresso é favorável à convenção, até porque o congresso é formado por patrões e patroas", afirma.
A PEC prevê a revogação do parágrafo único do inciso 34 do artigo 7º da Constituição, estabelecendo os mesmos direitos de trabalhadores urbanos e rurais também a empregados domésticos. Entre as principais mudanças estão o pagamento de hora-extra, adicional noturno, salário-família, o estabelecimento de carga horária de trabalho e FGTS. "Essa mudança vai acabar com a discriminação do trabalhador doméstico, e é isso o que nós queremos", diz a sindicalista, que aos dez anos de idade teve seu primeiro emprego numa casa de família.
A possível aprovação da PEC dentro dos padrões estabelecidos pela OIT, no entanto, vem preocupando os empregadores. "Isso vai gerar desemprego porque muitas pessoas não terão mais condições de pagar o que as novas determinações devem impor", afirma Margareth Galvão Carbinato, presidente do Sindicato dos Empregadores Domésticos de São Paulo - parece piada, mas ele existe. Margareth diz que as peculiaridades do trabalho doméstico no Brasil não estão sendo consideradas pelas mudanças. Diferentemente dos europeus, diz Carbinato, os brasileiros recebem alimentação e transporte dos patrões. E quem contrata, em grande parte, não são classes mais abastadas, e sim a classe média.
"Temos até mesmo muitas empregadas domésticas que são patroas – porque para trabalhar na casa de alguém são obrigadas a contratar pessoas a ficar com seus filhos. Então fica a pergunta: será que essas imposições da OIT também não vão prejudicar a vida dessas pessoas?", pergunta a advogada. Segundo ela, com os benefícios atuais – como previdência social e férias – um empregado doméstico chega a custar o dobro do valor de seus salários finais.
No entanto, nem todos recebem os benefícios já garantidos por lei. Segundo Creuza Oliveira, estima-se que no Brasil existam cerca de 8 milhões de empregados domésticos – mas apenas 25% deles têm carteira assinada. "Trabalhadores domésticos não são nem servos nem parentes", afirma a diretora do programa da OIT sobre Condições de Trabalho, Manuela Tomei, assegurando que esta condição fica bem clara com as novas normas sugeridas pela organização.
O diretor-geral da OIT, Juan Somavia, também enxerga as novas regras como um avanço. "Pela primeira vez nos ocupamos da normalização de um setor informal". Ele espera que a Convenção sobre o Trabalho Decente para Trabalhadores Domésticos possa não apenas melhorar a vida de mulheres desprivilegiadas, mas também ser um reforço na luta contra o trabalho infantil.
Segundo a OIT, nenhuma outra área do mercado internacional emprega tantas mulheres e em poucos setores há tanta exploração, violência e ausência de direitos. Estima-se que elas somam cerca de 700 mil só na Tailândia, 14 milhões na América Latina e a incríveis 20 milhões apenas na China.
A maioria tem baixa escolaridade e vem de famílias pobres. E, não raramente, as condições de trabalho são comparáveis às de um escravo – sobretudo porque estas mulheres na maioria das vezes moram na casa das famílias contratantes, trabalham isoladas e acabam ficando à mercê da vontade de seus patrões.
Para que a convenção de Genebra entre em vigor, é necessário que pelo menos dois países a ratifiquem. A expectativa é de que as mudanças também protejam os direitos dos trabalhadores imigrantes – um problema mais comum na Europa, por conta da contratação de pessoas do Leste Europeu, principalmente da  Hungria, Romênia e Bulgária. (Informações da Deutsche Welle)

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