terça-feira, 26 de julho de 2011

Profecias


O que não falta é gente prevendo que o mundo vai acabar daqui a pouco. Pode ser em alguns meses, alguns anos, a data não importa, o que vale é a profecia sobre o iminente fim dos tempos.
Geralmente quem faz o papel de oráculo é algum fanático religioso que, na confusão mental em que vive, deve mesmo estar acreditando na história que conta. Mas há também aquele picareta que anuncia o apocalipse para faturar alguma grana do tolos que acreditam na sua lorota.
Ser profeta, seja lá de que tipo, foi sempre um bom negócio. Alguns deles, menos radicais, vivem à custa de previsões mais modestas, como economistas que apontam quanto vai ser a taxa Selic ou a inflação do ano, quanto vai ser o crescimento do PIB, ou os famosos "cientistas sociais" que cravam com certeza absoluta quem vai ganhar a eleição. Como essas são previsões que não afetam em nada o dia a dia das pessoas, já que, se não se cumprirem ninguém dará a menor importância ao erro, a Terra continua a girar absolutamente indiferente aos seus habitantes.
Nunca fui bom em nada do gênero. Não consigo prever nem o que estarei fazendo daqui a algumas horas. Nem quero que isso aconteça: a vida já é aborrecida o suficiente com o imprevisível nos rondando.
E, por ser assim é que estou cada vez mais preocupado com o destino deste minúsculo planeta que gira em torno de uma pequena estrela. Nos últimos dias, pelo menos, a indústria de profecias deve estar faturando alto - ou não, já que certas coisas que pairam no ar indicam que nunca até hoje a Lei de Murphy, aquela que diz que "se algo pode dar errado, com certeza dará", esteve tão atuante.
Lá na distante década de 30 do século passado o argentino Enrique Santos Discépolo fez um tango que foi sucesso, entre outros, na voz de Carlos Gardel. Discépolo era um grande letrista e, pelo menos no seu "Cambalache", fugiu totalmente do padrão das músicas da época. Procurou expressar toda a sua insatisfação por viver num mundo em que "tudo é igual, nada é melhor, tanto faz um burro ou um professor".
A loucura do mundo que "sempre foi e sempre será uma porcaria" de Discépolo, aquele mundo de uns 80 anos atrás, infelizmente se repete hoje, com fanáticos religiosos assassinando a sangue frio centenas de pessoas, radicais de direita chantageando o presidente americano e ameaçando pôr fogo na ordem financeira internacional, intervenções militares absurdas de países ricos em países miseráveis ("é o petróleo, estúpido"), nações em ruínas por terem acreditado na receita ortodoxa neoliberal, uma persistente guerra comercial que afeta principalmente os mais pobres, uma ONU dominada por interesses coloniais, metrópoles sufocadas pela poluição dos escapamentos de milhões de veículos, florestas e animais sob ameaça.... A lista de iniquidades que o homem comete contra si mesmo parece não ter fim.
O que me alivia é que, como disse antes, sou um péssimo profeta. E, assim, espero que a óbvia previsão que eu poderia fazer de um doloroso fim do mundo não passe apenas de um desejo sublimado.
Sou tão ruim nesse ofício que, quem sabe, de toda essa confusão que está aí, possa sair algo que preste.

PS.: Para os curiosos, aí vai a letra de "Cambalache":

Que el mundo fue y será una porquería, ya lo sé,
en el quinientos seis y en el dos mil también;
que siempre ha habido chorros,
maquiávelos y estafáos,
contentos y amargaos, valores y dublé.
Pero que el siglo veinte es un despliegue
de maldá insolente ya no hay quien lo niegue,
vivimos revolcaos en un merengue
y en el mismo lodo todos manoseaos.
Hoy resulta que es lo mismo ser derecho que traidor,
ignorante, sabio, chorro, generoso, estafador.
¡Todo es igual, nada es mejor,
lo mismo un burro que un gran profesor!
No hay aplazaos ni escalafón,
los inmorales nos han igualao...
Si uno vive en la impostura
y otro roba en su ambición,
da lo mismo que sea cura,
colchonero, rey de bastos,
caradura o polizón.
¡Qué falta de respeto, qué atropello a la razón!
¡Cualquiera es un señor, cualquiera es un ladrón!
Mezclaos con Stavisky van don Bosco y la Mignon,
don Chicho y Napoleón, Carnera y San Martín.
Igual que en la vidriera irrespetuosa
de los cambalaches se ha mezclao la vida,
y herida por un sable sin remache
ves llorar la Biblia contra un bandoneon.
Siglo veinte, cambalache, problemático y febril,
el que no llora no mama y el que no roba es un gil.
¡Dale nomás, dale que va,
que allá en el horno te vamo a encontrar!
¡No pienses más, tirate a un lao,
que a nadie importa si naciste honrao!
Si es lo mismo el que labura
noche y día como un buey
que el que vive de las minas,
que el que mata o el que cura
o está fuera de la ley.

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