quarta-feira, 13 de abril de 2011
Iguais, porém diferentes
Os chefes de Estado de Brasil, Rússia, Índia e China, que formam o grupo que foi denominado Bric, se reúnem nesta quinta-feira em Sanya, no sul da China. O primeiro encontro desse tipo ocorreu em junho de 2009, na cidade russa de Ecaterimburgo. Desde então, os representantes dos quatro países vêm se encontrando regularmente, enquanto a sigla Bric assume a importância de uma força político-econômica de peso na geopolítica mundial.
Neste encontro na China, pela primeira vez, o presidente da África do Sul, Jacob Zuma, também estará presente, pois seu país aspira ingressar no clube dos mais promissores países emergentes. E assim o Bric se transformará em "Brics". Como em conferências anteriores, o grupo enfatizará seus pontos fortes e os aspectos em comum.
Na realidade, contudo, segundo reportagem da Deutsche Welle, as quatro nações são marcadas por trajetórias diversas, como explica Tobias Geyer, especialista em mercados emergentes do fundo de investimentos Ökoworld. O único denominador comum são as respeitáveis taxas de crescimento e o fato de serem nações relativamente grandes.
Claro que há outros emergentes com taxas de crescimento tão pronunciadas quanto as do Bric e com perfis demográficos talvez ainda mais positivos. "Mas, do ponto de vista do tamanho, os outros não são tão interessantes", comenta Geyer.
Cerca de 40% da população do planeta vive nos países do Bric. Em conjunto, eles são responsáveis por quase um quarto do desempenho econômico mundial e cresceram, em 2010, entre 4% (Rússia) e 10% (China). Entretando, apesar desses fatores em comum, é grande o número de diferenças entre eles, levando os especialistas ouvidos a duvidarem de uma suposta trajetória comum de sucesso.
"O Brasil e a Rússia dependem muito mais de exportações de matérias-primas do que a Índia e a China, que são até dependentes da importação de matérias-primas", aponta Markus Jäger, analista do Deutsche Bank Research. E a China cresce, sobretudo, graças às exportações de artigos industriais, enquanto na Índia o crescimento é impulsionado em geral pelo mercado interno.
A Rússia é a que menos se encaixa no grupo. Apesar de ostentar a maior renda per capita, muitos analistas consideram o país em decadência, enquanto os demais Bric vão ampliando o próprio potencial de poder. Geyer compartilha essa opinião, embora faça uma ressalva: "É preciso relativizar, diante dos atuais preços do petróleo. Entre os países do Bric, quem mais lucra com isso é a Rússia".
Por sua vez, Jäger aponta mais uma desvantagem russa: o desenvolvimento demográfico negativo. Há um grande número de idosos dependentes do Estado, porém insuficientes jovens para gerar valor econômico. Um problema que a China também pode vir a enfrentar, devido à política que incentiva só uma criança por casal.
No Brasil e na Índia, em contrapartida, cresce uma classe média que não apenas produz, como também consome em grande escala, assegurando assim a demanda interna.
Nos quatro países a política tem por hábito interferir em questões econômicas. No entanto, Pequim e Moscou controlam bem mais do que Brasília ou Nova Déli. Na China, os maiores bancos e indústrias pertencem ao Estado. Na Rússia, ele controla sobretudo a importante indústria petroleira, detendo mais de 70% do conglomerado Rosneft.
Todas essas diferenças não ficam sem consequências, afirma Jäger, do Deutsche Bank Research. "Os países do Bric divulgam comunicados afirmando que concordam em muitos aspectos. Mas também há uma quantidade de pontos de atrito de natureza econômica entre eles."
Um exemplo: as exportações brasileiras se ressentem no momento do real relativamente forte, cuja cotação em relação ao dólar americano duplicou nos últimos oito anos. Enquanto isso, a China mantém sua moeda em baixa por meios artificiais, acusa o Brasil.
Esse conflito monetário já levou até mesmo a Brasil a se distanciar do clube nessa questão, buscando contato com o mais importante adversário do Bric: os Estados Unidos. Assim, não é de espantar o anúncio de Pequim, antecedendo o encontro em Sanya, de que se recusaria a discutir assuntos monetários.
Segundo a reportagem da Deustche Welle, tais conflitos tendem a se acirrar no futuro, quando a África do Sul pertencer oficialmente ao clube dos emergentes, pois o país difere ainda mais dos outros quatro. Seu crescimento econômico é inferior ao russo, limitando-se a 3% ao ano. Com 50 milhões de habitantes, ela não passa de uma anã se comparada aos demais países.
Há indicadores de que, ao integrar a África do Sul, os membros do Bric visam menos o país em si do que o continente africano como um todo. Quer para saciar seu enorme apetite por matérias-primas – o caso da China –, quer para também lucrar com a extração desses recursos – o que se aplica ao Brasil.
E é justamente isso o que deixa tantos sul-africanos desconfiados. Até mesmo o vice-ministro de Desenvolvimento Econômico, Enoch Godongwana, mostrou-se cético: para ele, ainda não está claro se o comprometimento com o Bric "serve aos interesses da África do Sul ou os prejudica".
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