quinta-feira, 3 de março de 2011

A festa para Gorbachev


A internet avisa que Mikhail Gorbachev, o homem que acabou com a União Soviética, está celebrando seus 80 anos de vida de maneira discreta: vai receber cerca de 300 amigos e parentes num restaurante moscovita. Em Londres, porém, no dia 30, será homenageado no Royal Albert Hall, que deverá estar repleto de personalidades políticas e artísticas de vários lugares do mundo. Até membros da família real inglesa estão sendo esperados para o grande evento.
Dá para entender porque Gorbachev é mais festejado fora do que em seu próprio país. O processo de desintegração da URSS foi traumático, levou ao colapso vários Estados que se abrigavam sob o guarda-chuva soviético, deixou na penúria milhões de pessoas, tornou alguns poucos milionários, aprofundou as desigualdades.
Há muitos que culpam Gorbachev e suas perestroika e glasnost pela tragédia. Outros acham que ela era inevitável, pois as péssimas condições econômicas do urso soviético já indicavam a sua situação terminal.
Seja como for, o fim da URSS foi também o fim da carreira política de Gorbachev. O aclamado líder, com a ascensão do rival Boris Yeltsin, virou um fantasma a vagar pelo mundo a fazer palestras - esse parece ser o destino de quase todos os ex-presidentes...
Em novembro de 2008 lembrei aqui nestas "Crônicas" uma cena de comédia ocorrida durante uma visita de Gorbachev ao Estadão. A lembrança da breve estada do ex-líder soviético no jornal dos Mesquitas foi motivada por uma declaração que ele havia dado dias antes sobre a eleição de Obama Barack à Presidência dos Estados Unidos. Para quem não leu aquela crônica, aí vai ela abaixo, na íntegra.
Perco o amigo, mas não perco a piada...

Gorbachev e o jornal errado


Algum tempo depois de ter destruído a União Soviética, Mikhail Gorbachev passou a viver, entre outras coisas, de palestras, seguindo o exemplo de vários colegas ocidentais. Corria o mundo a divulgar seu feito, temperando a conversa com alguns conselhos e observações sobre política internacional, que os ouvintes fingiam acreditar ser sérios, para esquecer logo em seguida.
Tantas viagens acabaram trazendo-o ao Brasil, mais precisamente a São Paulo. Num intervalo do interminável oba-oba com que os nativos o presentearam, o líder aposentado foi parar no Estadão para ver como é que funcionava um dos principais baluartes da recém-florida democracia liberal que aqui se instalava.
Quando surgiu na redação, dezenas de curiosos, de contínuos a jornalistas de todos os calibres, o cercaram. Gorbachev parou diante de uma mesa, sorriu o sorriso dos predestinados, sentou-se na cadeira vaga e pegou um dos jornais que ali se achavam amontoados. Ao abrí-lo, o espoucar de flashes parecia fogos de artifício.
E não deu nem tempo de avisá-lo que havia escolhido o jornal errado: Gorbachev posava para a imortalidade do Estadão passando os olhos numa Folha!
A balbúrdia daquele momento foi tamanha que ninguém ligou para a gafe. O fato é que Gorbachev se despediu sob uma calorosa salva de palmas e um princípio de confusão, quando uma veterana integrante daquela equipe de bravos jornalistas agarrou a cadeira que o ex-líder havia usado e determinou, entre categórica e histérica:
- É minha, é minha! Ninguém mais vai sentar nela!
Bem, Gorbachev pode ter dado no Estadão uma aula de como não se faz marketing, mas ultimamente o veterano servidor do capitalismo liberal tem usado todas as lições que aprendeu dessa matéria para voltar à berlinda.
Deve ter imaginado que a crise financeira global é tão séria que até mesmo ele surge como uma opção para os desesperados chefes de Estado que se surpreendem a cada dia com mais novidades sobre os estragos causados pela insensatez de uma doutrina levada aos seus extremos.
Ao comentar a vitória de Barack Obama a jornais de diferentes línguas, Gorbachev aconselhou-o a adotar nos Estados Unidos a sua "perestroika" ("reestruturação"), receita a seu ver infalível para reanimar Estados em grau adiantado de decomposição.
Obama, de sólida formação acadêmica, sabe os efeitos que a perestroika teve na União Soviética e deve dispensar a sugestão.
O novo presidente dos Estados Unidos ainda não leu o jornal errado.

Um comentário:

  1. Vamos ser justos quem começou o processo de autodemplição da URSS foi Krushev em 1956,o Gorbachev só concluiu o trabalho sujo,EM 1991, da alta burocracia russa e da KGB que são os atuais oligarcas da RUSSIA.

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