Agora que o governador José Serra finalmente começa a se expor como candidato da oposição à Presidência da República, é bom ficar olho no que vai propor como programa de governo. Tarefa difícil, já que, como membro da alta tucanagem, tem por princípio exibir em público apenas a plumagem reservada para ocasiões especiais.
Sabe-se, por exemplo, que ele vai destacar a importância de elevar a taxa de emprego no país - como se ela, sob o governo Lula, não tivesse batido recordes sobre recordes. O tema, especialmente para os teóricos da dobradinha PSDB-PFL, é quase tabu. Talvez por isso o economista e engenheiro Luiz Carlos Mendonça de Barros, o Mendonção, que presidiu o BNDES e foi ministro das Comunicações de FHC, o trate de maneira sui generis, indo completamente na contramão de tudo o que indica o bom-senso.
O texto em grifo abaixo é parte de um artigo que escreveu para a Folha, intitulado "Copom: decisão política ou técnica", no qual ele lamenta a manutenção da Selic no nível atual. O refinamento intelectual e a sensibilidade social do escrito vão além de qualquer análise:
Além disso, a geração de empregos está acontecendo com a mesma intensidade de antes de setembro de 2008. Nos últimos cinco meses, as estatísticas do Ministério do Trabalho apontam para um aumento anual de quase 2,5 milhões de postos de trabalho no mercado formal. Com isso, a massa de salários deve em breve crescer a uma taxa anual superior a 6,5% ao ano.
Sem alterações nesse ritmo, a taxa de desemprego poderia chegar a 5% ao final de 2010, nível nunca visto no país. Certamente não chegaremos a esse ponto, pois as condições de demanda e oferta de mão de obra qualificada não permitem um número tão baixo. Fica claro, portanto, que é preciso uma sensível desaceleração do crescimento do emprego para evitar o aumento de pressões inflacionárias.Parece incrível, mas foi isso mesmo o que o Mendonção escreveu naquele espaço cativo que tem na Folha: contra a inflação, o remédio é desempregar. E ele diz isso em plena campanha eleitoral!
Está certo que a ideologia tucana é tão ampla que permite toda espécie de desatino. Mas esse desprezo por tudo o que lembra o povo poderia diminuir pelo menos agora. O que acontece, porém, é justamente o contrário.
Outro tucano de alta plumagem, o vice-governador paulista Alberto Goldman, que em breve estará substituindo José Serra no governo, mostrou o que pensa do processo eleitoral - e do próprio sistema democrático - numa entrevista que deu ao Valor. A certa altura, ele é perguntado sobre o que achou das últimas pesquisas eleitorais. E saiu-se com essa pérola:
A importância que dou às pesquisas é zero. Não tem demora nenhuma. Vai perguntar para o cidadão se ele está preocupado com quem vai ser o próximo presidente! Claro que os políticos profissionais estão atuando, fazendo composição política. Se perguntar para a população, 30% é capaz de chutar um nome, sem compromisso. Somando tudo isso, não dá nada.
As posições de Mendonção e Goldman não são exceções entre os integrantes da elite brasileira, representada politicamente pelo conglomerado PSDB-PFL. Ao contrário, o que eles expressaram em dois jornais insuspeitos é exatamente o que pensam - e o que sempre foi colocado em prática no tempo em que estiveram no poder.
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