O presidente Lula simplificou perigosamente a discussão sobre o uso de dinheiro público ao dizer que vê como "hipocrisia" a repercussão das notícias de que parlamentares usam a cota de passagens aéreas para patrocinar viagens de familiares e amigos.
"Estou vendo agora a hipocrisia do salário na Câmara. Parece um escândalo: faça um levantamento da história da Câmara e veja se algum dia foi diferente? Sempre foi assim, não sei por que as pessoas não têm coragem de assumir as coisas como elas são", disse ele.
"Não acho correto, mas não acho um crime um deputado dar uma passagem para um dirigente sindical ir a Brasília. Eu, quando era deputado, muitas vezes convoquei dirigentes da CUT, dirigentes de outras centrais para se reunirem com passagem do meu gabinete. Graças a Deus, nunca levei nenhum filho meu para viajar para a Europa com passagem", completou.
Ainda bem, para que a sua declaração não soasse inteiramente infeliz, que ele fez uma distinção entre usar a cota para o transporte de, por exemplo, um sindicalista participar de uma reunião, e levar um familiar para fazer turismo.
Há, realmente, uma distância enorme entre os dois casos. Como há uma distância abissal entre o senso ético que deve prevalecer no trato da coisa pública e a sua prática no Brasil.
O fato de nossos parlamentares - e, como se viu, o próprio presidente da República - não saberem distinguir entre o que é deles, ou o que foi dado a eles para que façam seu trabalho da melhor maneira, e o uso do dinheiro público para fins particulares, mostra como a democracia brasileira ainda tem um longo caminho a percorrer.
Não se indignar com isso, achar que o desvio ético deve ser tolerado porque ele sempre existiu, é estar do lado do infrator. É assim, bancando a avestruz, jogando a sujeira para debaixo do tapete, que se pretende construir um país?
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