segunda-feira, 30 de abril de 2012
A armadilha da austeridade
A situação dos trabalhadores não está nada boa, segundo diagnóstico da Organização Mundial do Trabalho (OIT) expressa no "Informe sobre o Trabalho no Mundo 2012 - Melhores Empregos para uma Economia Melhor", que vê o planeta vítima da "armadilha da austeridade", situação criada pelos países desenvolvidos que entraram numa profunda crise econômica a partir de 2008 e resolveram sair dela apertando o cinto.
Na parte final do resumo do relatório, a OIT mete o pau nos governos que resolveram adotar essa estratégia para superar seus problemas: "Desde 2010, e apesar das declarações a favor do emprego nas sucessivas reuniões do G-20 e outros fóruns globais, a estratégia política mudou suas prioridades, afastando-se da criação e da melhora do emprego e concentrando-se na redução dos déficits fiscais a todo custo. Nos países europeus, a redução do déficit fiscal foi considerada essencial para acalmar os mercados financeiros. Mas mesmo em países que não sofreram efeitos da crise, essa estratégia está sendo aplicada por razões preventivas, reduzindo os déficits fiscais para evitar qualquer reação negativa por parte dos mercados financeiros. Esse enfoque pretendia preparar o caminho para investimentos maiores e crescimento, junto com déficits fiscais menores."
A OIT aprofunda o tema: "Ademais, como parte das mudanças políticas, a maioria das economias avançadas tem flexibilizado as normas do trabalho e debilitado as instituições do mercado de trabalho, ao mesmo tempo que anuncia mais medidas de liberalização. Essas medidas estão sendo adotadas com a esperança que os mercados financeiros reajam de maneira positiva e assim reforcem a confiança, o crescimento e a criação de emprego."
A estratégia, segundo a OIT, não funcionou: "Nos países que aplicaram o enfoque da austeridade e da liberalização mais profundamente, principalmente em países do sul da Europa, o crescimento econômico e do emprego continuou deteriorando-se. Em muitos casos essas medidas também fracassaram na estabilização da situação fiscal. A razão fundamental para esses fracassos é que essa política, adotada num contexto de perspectivas de demanda limitada e com a complicação adicional de um sistema bancário em meio a um processo de "desalavancagem", não tem a capacidade de estimular o investimento privado. A armadilha da austeridade foi acionada. A austeridade, com efeito, produziu um crescimento econômico mais fraco, aumentando a volatilidade e piorando o balanço financeiro dos bancos, o que ocasionou uma maior contração do crédito, menores investimentos e, em consequência, maiores perdas de empregos. Paradoxalmente, isso afetou de maneira negativa os orçamentos dos governos e, portanto, aumentou a exigência de maior austeridade. A realidade é que tem havido poucos progressos nos déficits fiscais dos países que aplicaram energicamente as medidas de austeridade."
A OIT destaca, porém, que nem todos têm agido desse modo: "Muitos países emergentes e em desenvolvimento adotaram a estratégia de estimular a demanda interna com o objetivo de compensar as fracas perspectivas de exportação para as economias avançadas. Existem sinais de que em alguns desses países, como a Índia, os da América Latina, África do Sul e, mais recentemente, a China, os salários aumentaram para recuperar terreno em relação à produtividade. O investimento público e a proteção social também foram fortalecidas e a integração regional demonstrou ser benéfica."
A OIT estima que existe um déficit global de 50 milhões de empregos em relação à situação anterior à crise e que "é pouco provável que nos próximos dois anos a economia mundial cresça num ritmo suficiente para reduzir o atual déficit do emprego e ofereça trabalho a mais de 80 milhões de pessoas que deverão entrar no mercado de trabalho nesse período".
A receita da OIT para o mundo escapar da "armadilha da austeridade" é passada em três pequenos parágrafos:
"O informe sobre o trabalho no mundo do ao ano passado apresentava um enfoque triplo, que se mantém vigente. Primeiro, as instituições do mercado de trabalho deveriam se fortalecer de modo que os salários cresçam no mesmo ritmo da produtividade, começando nos países com superávit. Na situação atual, é necessário ter em conta um aumento rigoroso e coordenado do salário mínimo. Também podem ser úteis maiores esforços para adotar as normas fundamentais do trabalho, sobretudo nos países emergentes e em desenvolvimento, onde existem problemas. A ratificação dos convênios fundamentais da OIT por parte dos países do G-20 daria um sinal positivo nesse sentido.
"Segundo, é essencial retomar o acesso ao crédito e criar um ambiente empresarial mais favorável para as pequenas empresas. Isso é particularmente urgente nos paises da Zona do Euro, onde a política do Banco Central de oferecer liquidez aos bancos fracassou na hora de incentivar o crédito destinado à economia real. Seria necessária uma taxação maior para as empresas que não reinvestem seus lucros e uma taxação menor para aquelas que dão prioridade aos investimentos e à criação de empregos.
"Terceiro, é possível promover o emprego e ao mesmo tempo cumprir com os objetivos fiscais. O informe demonstra que um câmbio neutro do ponto de vista fiscal na composição dos gastos e das receitas criaria entre 1,8 a 2,1 milhões de empregos num prazo de um a dois anos. No caso dos países emergentes e em desenvolvimento, os esforços deveriam se concentrar no investimento público e na redução da pobreza e desigualdades de renda, e em estimular a demanda agregada. Nas economias avançadas, a prioridade deveriam ser as pessoas desempregadas, especialmente os jovens, a fim de garantir que recebam o apoio adequado para encontrar novos empregos."
O problema todo é que os governos dos países ricos não parecem estar dispostos a seguir esse receituário, que para os gênios que comandam as suas economias soa um tanto quanto heterodoxo.
Azar o deles, azar o nosso.
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