quarta-feira, 9 de novembro de 2011
A lei da espingarda
Outro dia passei por uma barreira policial montada para fiscalizar o cumprimento da chamada "lei seca". Os homens da Polícia Militar deixaram apenas uma faixa para os carros passar, se colocaram nos dois lados dessa pista, com coletes à prova de balas, como se estivessem prontos para uma operação de guerra. Um PM vigiava o desfile dos veículos, com uma espingarda apontada para os carros. Fiquei imaginando a sua reação se um escapamento qualquer resolvesse "explodir" naquele momento...
Aquele PM me lembrou outro, aquele da foto da Folha, que também aponta uma espingarda para a cabeça de um estudante da USP, momentos depois de ter sido retirado do prédio da reitoria. O rapaz já está dominado, com as mãos atrás da cabeça, e além disso é vigiado por outros policiais.
Os dois PMs com suas armas apontadas para alvos desarmados, incapazes de qualquer ato violento, me remeteram a uma outra imagem, mais antiga, também marcante por sua simbologia, a do então governador José Serra com um fuzil, boca aberta, mirando sabe-se lá o quê, talvez seus inimigos políticos, talvez os fantasmas que têm sistematicamente destruído os seus sonhos de poder.
Esses três homens com suas armas poderosas representam, talvez, o lado mais perverso desta nossa jovem democracia - o resquício ainda profundo da ditadura militar no nosso cotidiano. É impressionante que, passados mais de 20 anos, ainda tenhamos de conviver com esse tipo de gente, que tem na força seu único argumento, que age como se estivesse acima da Constituição, acima dos direitos mais básicos dos cidadãos.
Uma blitz de trânsito não pode ter as mesmas características de uma operação militar, com soldados armados ostensivamente para abordar motoristas que, na maioria, estavam voltando do trabalho para casa. Da mesma forma, uma operação de desocupação de estudantes dentro da mais conceituada universidade do país não pode ser igual a um confronto com perigosos bandidos. E nem é conveniente a um governador fazer pose de xerife do Velho Oeste numa solenidade pública.
Essas coisas desmerecem a vida republicana, mostram que o país ainda precisa caminhar muito para se transformar numa democracia de verdade, na qual os servidores públicos ajam de acordo com as suas obrigações, sem ir além de suas funções e responsabilidades, e que compreendam que o bem mais importante de todos é a dignidade humana.
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