sexta-feira, 11 de novembro de 2011
A faixa assassina
O trânsito até que estava bom, para os padrões paulistanos, ontem no trajeto que faço de casa até o trabalho. Ia a menos de 50 km/h pela Avenida São Gualter, na faixa da esquerda, emparelhado com um Novo Uno, na mesma velocidade. De repente, o carro estremece com uma batida. De relance, vejo pelo retrovisor algo que se assemelha a uma moto e um corpo.
O Uno para na calçada, alguns metros à frente. Faço o mesmo. Desço e sigo em direção a algumas pessoas que estão em volta do motoqueiro, sentado no meio fio, as mãos entre a cabeça baixa, um pé descalçado, a moto aparentemente inteira.
Pergunto como está, ele responde que acha que não se feriu. Um dos rapazes ao seu lado diz que depois que bateu na lateral de meu carro a moto virou e passou sobre seu corpo. O motorista do Uno repete a frase "não dava para você passar entre a gente". Faço a ele um sinal para que fique quieto. Peço então que o motoqueiro se levante para ver se sente alguma dor no corpo. Ele obedece, diz que está tudo bem, que não foi nada. O motorista do Uno diz que está atrasado, que precisa pegar seus filhos na escola.
E vamos embora.
O que aconteceu comigo é algo que se repete centenas de vezes ao dia em São Paulo. As estatísticas oficiais dizem que 478 motoqueiros morreram no ano passado na metrópole. Cerca de 20 acidentes com motos são registrados diariamente.
A convivência entre os veículos de duas rodas e os de quatro ou mais rodas é selvagem no trânsito paulistano, fruto do absurdo que foi o veto do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso ao artigo do Código de Trânsito Brasileiro que proibia a circulação das motos entre as faixas, em 1997, sob a alegação que ele iria quebrar a indústria do setor.
Desde então, o que se vê na cidade é uma guerra entre motoqueiros e motoristas, cada um se achando com mais direitos que os outros, numa disputa em que todos perdem.
A situação trágica pode ainda ser revertida se o projeto do deputado paulista Newton Lima, do PT, que proíbe a circulação de motos e outros veículos de duas rodas entre a calçada e os veículos ou entre veículos de faixas adjacentes, esse espaço que se chama de "corredor", for aprovado.
Mas cá entre nós: se as autoridades que cuidam do trânsito tivessem um mínimo de bom-senso e responsabilidade, com ou sem o projeto, já teriam feito algo para proibir essa prática assassina.
Era só, por exemplo, aplicar o artigo 192 do Código de Trânsito Brasileiro, que trata da distância lateral e frontal a ser mantida entre dois veículos nas vias, sejam eles quais forem, e classifica as infrações aos limites definidos como graves.
Como se vê, há solução para tudo.
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