quinta-feira, 25 de agosto de 2011
Morte em duas rodas
Não me canso de escrever sobre o trânsito paulistano, ou melhor, sobre o caos viário da capital. É que grande parte das mazelas da cidade advém do fato de as pessoas gastarem grande parte do dia confinadas em carros, espremidas em ônibus ou nos vagões do metrô.
Isso acaba com a saúde de qualquer um, estressa até o mais despreocupado dos mortais. E, além de tudo, o trânsito paulistano é um dos maiores assassinos que estão à solta por aí, a praticar seus crimes impunemente, sem que ninguém dê bola para as atrocidades que comete.
O pior é que, tudo indica, não há solução à vista. As autoridades continuam a investir no transporte individual, o carro é cada vez mais oferecido como objeto de desejo para uma classe média extremamente consumista, as medidas que volta e meia são anunciadas não passam de meros paliativos, quando muito - quase sempre são factoides para manter o nome desse ridículo prefeito paulistano em evidência.
Matéria publicada pela Agência Brasil com alguns participantes do Fórum Paulista de Prevenção de Acidentes de Trânsito e Transportes, promovido pelo Conselho Estadual para Diminuição de Acidentes de Trânsito e Transportes (Cedatt) mostra a dimensão do problema e um faceta praticamente ignorada por todos, que é o risco a que se expõem diariamente os motoqueiros, essa enorme legião de jovens que cruza a cidade como malucos.
Segundo a reportagem, o aumento do número de acidentes de trânsito envolvendo motocicletas no Brasil preocupa não só os órgãos de trânsito do país, como a própria Organização Mundial da Saúde (OMS), que está convencida de que os motociclistas são os principais responsáveis pelos acidentes.
“Consideramos que 70% das causas [de acidente] são devidos a fatores humanos. E, agora, temos o problema das motocicletas: com o aumento da frota de motocicletas aumentou muito o número de acidentes devido a má condução do veículo”, disse Mercedes Maldonado, representante da OMS no Brasil. Mercedes apresentou números para mostrar que as principais causas de acidente de trânsito no Brasil são excesso de velocidade (26%), infraestrutura rodoviária (20%) e motocicletas (16%).
Segundo o presidente da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), Ailton Brasiliense, as maiores vítimas de acidentes de trânsito no Brasil ainda são os pedestres, mas os motociclistas já ocupam a segunda posição. “Metade das pessoas que morrem anualmente é pedestre. Em segundo lugar, e crescendo enormemente, estão os motociclistas. Há também uma questão que envolve o excesso de velocidade com ou sem alcool e a da má habilitação”, disse ele.
Já o presidente da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet), Mauro Ribeiro, alertou: “Temos lugares no país onde 50% dos óbitos são de motociclistas”.
Um dos problemas apontados por especialistas é o uso do chamado "corredor", o espaço estreito entre uma faixa e outra da via. Brasiliense explicou que, ao usar o corredor para ultrapassar os carros, o motociclista deixa de ser visto por, pelo menos, um dos três espelhos retrovisores que o motorista de automóvel tem à disposição, "aumentando enormemente a possibilidade dele se acidentar”.
Segundo José Guedes Pereira, presidente do Sindicato das Auto Moto Escolas e Centro de Formação de Condutores no Estado de São Paulo, o elevado número de acidentes envolvendo motocicletas deve-se, principalmente, ao veto do artigo 56 do fato de o Código Nacional de Trânsito. O artigo proibia expressamente a circulação de motocicletas nos corredores.
“Isso fez com que o motociclista mudasse o comportamento. Como temos as motos circulando muito entre os veículos, criamos uma situação de mobilidade diferente, de massa diferente e de velocidade diferente. Isso expõe uma situação de risco muito grande. Já estamos chegando a acidentes de moto com moto”, disse Ribeiro, que defende a proibição do tráfego de motos nos corredores.
Outro problema apontado no encontro é a má formação dos motociclistas. Segundo Wilson Kenji Yasuda, coordenador da Comissão de Segurança Viária da Associação Brasileira dos Fabricantes de Motocicletas, Ciclomotores, Motonetas, Bicicletas e Similares (Abraciclo), uma pesquisa recente feita com acidentados no trânsito revelou que 70% dos motociclistas envolvidos em acidentes não tinham carteira de habilitação.
Para reforçar a informação dada pelo representante da Abraciclo, o presidente do sindicato das motoescolas apresentou um dado preocupante: “Mais de 90% das pessoas que procuram uma autoescola para obter a carteira de moto já são motoqueiros, ou seja, aprenderam de alguma forma, não sabemos como”, disse José Guedes Pereira.
Apesar da gravidade do problema, as políticas públicas que poderiam ajudar a reduzir os índices de acidentes envolvendo motocicletas esbarram na falta de informações confiáveis. Mauro Ribeiro, da Abramet, reclamou que não há dados anuais sobre acidentes de trânsito no país e os poucos números disponíveis não refletem a realidade do país, pois ignoram características particulares de cada região, de cada Estado ou município, e nem levam em consideração o que causa os acidentes.
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