domingo, 1 de agosto de 2010

O juízo final


A candidata do PV à Presidência, Marina Silva, sem querer, levantou uma questão importante para o debate eleitoral. Numa entrevista a uma rádio do Nordeste, disse que tem sofrido preconceito por ser cristã evangélica. "Mas eu não sou uma cristã envergonhada, eu digo a minha fé", afirmou, certamente mirando a adversária Dilma Rousseff, que tem sido dúbia sobre se professa ou não alguma fé religiosa.
Os candidatos à Presidência geralmente abordam pouco a questão do papel da religião no Estado. Mesmo Marina Silva se esconde do tema. Nessas horas, ser lacônico é a melhor tática: uma declaração qualquer pode agradar um lado e desagradar o outro, pode render votos entre evangélicos e tirar dos católicos.
Sim, porque apesar de o Brasil ser um Estado laico, a presença da religião é muito forte no dia a dia - a sua presença e todas as implicações que ela tem, no tocante à alta carga de intolerância contida em seus cultos, mensagens e ações.
Quando Marina Silva se disse vítima do preconceito, ela se esqueceu de informar que a sua própria igreja é fonte permanente de discriminação. Evangélicos estão lá no topo de uma hipotética escala de fanatismo.
Outro detalhe que passou despercebido pela candidata verde é que qualquer um de nós que não acredita em fadas e duendes, ou espíritos benignos e malignos, tem o direito de achar que uma pessoa que passa boa parte de sua vida a ouvir sermões sobre o quanto é insignificante perante o intangível, é, no mínimo, esquisita.
Isso só pode soar como preconceito aos ouvidos de quem crê estar de posse de uma verdade absoluta, acima de tudo e de todos - e da própria razão.
Na mesma entrevista, Marina lembrou que "estamos elegendo o presidente da República, e não o pastor da igreja" e que não fará "a satanização dos outros candidatos". Por pouco não conseguiu descer ao nível dos comuns e normais, pois se a primeira afirmação soou óbvia, a segunda pareceu mais uma ameaça.

Um comentário:

  1. Sou agnóstico. Não sei da sinceridade de Marina em suas declarações. Mas não posso deixar de dizer que, até aqui, ela tem sido bastante equilibrada e coerente em relação ao tema. Quando fala em preconceito, fala no tratamento desigual em relação aos candidatos (supostamente) católicos, que acreditam (ao menos em tese) tanto num Deus pessoal e criador quanto ela. Nossa sociedade não tem dificuldade em separar só Igreja e Estado; confunde, igualmente, privatismo e interesse público; patrimonialismo e generosidade. A discussão é outra, e Marina fala disso com bastante clareza, uma clareza que resistimos a aceitar.

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