Há inúmeros outros exemplos de "cientistas políticos" convocados pela imprensa para, com o pretexto de analisar o momento eleitoral, na realidade passar recados, alguns nada sutis, para o candidato oposicionista.
Um dos mais constantes é Alberto Carlos de Almeida, que já fez vários artigos com o único intuito de orientar Serra a adotar, em sua campanha, o mote da diminuição da carga tributária.
Sua última investida, no Estadão, também é digna de destaque. O trecho escolhido é um pouco longo, mas é imperdível (os grifos são meus):
"... as aparições públicas do Serra bem preparado têm sido piores do que as da Dilma inexperiente. Serra fala em intervenção no Banco Central, discute com a Miriam Leitão, diz para Sabrina Sato que já nasceu preparado para os debates e trata dos temas que não importam em uma campanha presidencial.
Dilma adota a disciplina de uma boa guerrilheira. Ela segue o script e corrige eventuais erros. Falou uma vez em volta da CPMF, foi criticada e abandonou a ideia. Já foi contra Palocci e hoje viaja a Nova York com ele a tiracolo. Defende redução de impostos nos remédios e promete tirar mais gente da pobreza e levar para a classe média.
Apesar disso tudo, Serra é mais bem preparado do que Dilma. Porém, de nada adianta essa enorme superioridade técnica se isso não for convertido em votos. Em política, todos sabemos, o que importa é conquistar o poder. A capacidade de ouvir de Dilma e do PT parece que até agora tem sido muito mais útil para esse propósito do que a determinação e preparação técnica de Serra."
Como se vê, o "cientista político" apresenta aos caros leitores um Serra superdotado de virtudes e uma Dilma que não passa de uma fraude, um camaleão que muda o discurso a toda a hora e abusa da demagogia - uma análise, convenhamos, nada fria, nem um pouco científica, apenas um papo de torcedor.
Mas tem mais. O trecho abaixo, de uma "reportagem" do mesmo Estadão, é um esforço notável de contorcionismo. A tese, absurda - é um perigo um candidato ser bem conhecido do eleitorado -, é apresentada pelos tais "analistas" como algo sério:
O cientista político Humberto Dantas, conselheiro do Movimento Voto Consciente, credita a Lula a tendência de alta de Dilma nas pesquisas eleitorais e alerta quanto ao risco de o crescimento da petista ser interrompido a partir do momento em que cessar a transferência da popularidade do presidente, acima dos 80%, à sua candidata.
"Se não houvesse o apoio do Lula, Dilma não teria essa pontuação. Mas é importante ressaltar que ela está chegando ao limite." Dantas observa que, a partir deste momento, o confronto será de candidato contra candidato, o que pode prejudicar a petista. "A Dilma não tem experiência eleitoral e não é preparada eleitoralmente. O maior adversário dela é ela mesma." O cientista político avalia ainda que o resultado da pesquisa CNI/Ibope de intenções de voto, que aponta Dilma com vantagem de cinco pontos porcentuais sobre o seu principal adversário, José Serra (PSDB), é mérito de Lula. "Ela não ganha a eleição, mas o Lula."
O especialista em pesquisa eleitoral e em marketing político Sidney Kuntz identifica margem de crescimento para Dilma nas próximas pesquisas de opinião, mas questiona se em longo prazo a petista terá "mais gás para subir". "Quando grande parte da população souber que ela é a candidata do Lula, as pessoas vão se perguntar se estão votando por capacidade da candidata ou pelo apoio do Lula." Kuntz observa que, como toda a campanha eleitoral desde 1989, os debates e os confrontos de ideias entre os candidatos pode prejudicar Dilma. "Esses elementos mexem na eleição e colocarão Dilma à prova."
O cientista político Marco Antonio Carvalho, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), endossa a opinião de Kuntz. De acordo com ele, ainda há espaço para Dilma crescer nas pesquisas, tanto por conta da estratégia de Lula em associar a sua imagem à petista como pelo grande número de eleitores que ainda não sabem que a ex-ministra é a sua candidata. "Mas podem haver escorregões de percurso que podem prejudicá-la."
O engraçado de tudo é que todo esse esforço para convencer o eleitorado de que Serra é a melhor escolha não leva a nada. Quem lê o Estadão, ou a Folha, ou o Globo, ou Veja, ou escuta a CBN, já é eleitor tucano, odeia Lula, o PT e Dilma.
Ou seja: os nossos doutos "cientistas" nem precisariam se esforçar tanto em fazer sua torcida ser entendida como uma análise séria. Bastaria dizer, como Nelson Rodrigues em todas as suas crônicas, que são fanáticos tricolores.
E sair gritando pelas ruas: "É Serra, é campeão!"
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