Uma das mentes mais lúcidas das últimas décadas, o historiador marxista Eric Hobsbawn acha que um dos perigos da crise financeira global é fortalecer num primeiro momento os regimes de direita. Em entrevista à BBC, ele também compara o que se vê agora ao desfacelamento da União Soviética. Porém, diz, o fim dessa era não é de todo ruim, pois obriga as pessoas a pensar num novo modelo ideológico, uma mescla do capitalismo e do socialismo. Vamos ao que disse Hobsbawn:
"Nos anos 30, o claro efeito político da Grande Depressão a curto prazo foi o fortalecimento da direita. A esquerda não foi forte até a chegada da guerra. Então, eu acredito que este é o principal perigo. Depois da guerra, a esquerda esteve presente em várias partes da Europa, inclusive na Inglaterra, com o Partido Trabalhista, mas hoje isso já não acontece. A esquerda está virtualmente ausente, Assim, me parece que o principal beneficiário deste descontentamento atual, com uma possível exceção - pelo menos eu espero - nos Estados Unidos, será a direita."
"Acredito que esta crise é equivalente ao dramático colapso da União Soviética. Agora sabemos que acabou uma era. Não sabemos o que virá pela frente. Temos um problema intelectual: estávamos acostumados a pensar até então que havia apenas duas alternativas: ou o livre mercado ou o socialismo. Mas, na realidade, há muito poucos exemplos de um caso completo de laboratório de cada uma dessas ideologias. Então eu acho que teremos de deixar de pensar em uma ou em outra e devemos pensar na natureza da mescla. E principalmente até que ponto esta mistura será motivada pela consciência do modelo socialista e das conseqüências sociais do que está acontecendo."
No momento em que a OCDE, o clube dos 30 países mais ricos do mundo, publica um documento no qual mostra que a desigualdade entre seus sócios aumentou 7% no período entre 1985 e 2005, a análise de Hobsbawn é certeira:
"Sempre dissemos que o capitalismo iria se chocar com suas próprias dificuldades (...) O que é certo é que as pessoas descobrirão que de fato o que estava sendo feito não produziu os resultados esperados. Durante 30 anos os ideólogos disseram que tudo ia dar certo: o livre mercado é lógico e produz crescimento máximo. Sim, diziam que produzia um pouco de desigualdade aqui e ali, mas também não importava muito porque os pobres estavam um pouco mais prósperos. Agora sabemos que o que aconteceu é que se criaram condições de instabilidades enormes, que criaram condições nas quais a desigualdade afeta não apenas os mais pobres, como também cada vez mais uma grande parte de classe média. Sobretudo, nos últimos 30 anos, os benefíciários deste grande crescimento têm sido nós, no Ocidente, que vivemos uma vida imensuravelmente superior a qualquer outro lugar do mundo."
Às vésperas de um novo encontro dos mais influentes líderes mundiais, todos ainda se sentem inseguros quanto aos rumos da economia - e, por conseqüência direta e imediata - da própria vida no planeta. Certeza mesmo é que, passado o terremoto, uma nova paisagem surgirá no horizonte. Quem sabe, de cores mais suaves.
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