Nunca imaginei, nem nos momentos em que estive imerso nos pensamentos mais desesperançosos, que depois de ultrapassar a barreira dos 60 anos, num mundo repleto de maravilhas, estaria sentindo o desconforto espiritual daqueles que nada entendem, por mais que busquem as respostas para os enigmas que cotidianamente lhes são propostos.
Tolo, achei que com a idade viria a sabedoria, se não aquela dos iluminados, pelo menos a que proporciona ao homem comum a tranquilidade de ver os dias escorrerem sem sobressaltos pela ampulheta do tempo.
Confesso, porém, que, mais que nunca, estou tomado pela estupefação, pelo temor, e por uma ignorância absoluta da compreensão destes dias.
Será que o mundo enlouqueceu - se não todo, ao menos este colorido Brasil no qual vivo?
Ou será que a loucura que constato é apenas minha - como se sabe, os loucos são os últimos a saber de sua condição...
Volto ao tempo.
Lembro de como eu era há quatro décadas - um jovem idealista, mais ou menos sério, que tentava, por meio de seu trabalho, contribuir, de alguma forma, para melhorar a comunidade em que vivia, a sonolenta Jundiaí dos anos 70.
Sem saudosismo, apenas como modo de comparação, recordo que, naqueles anos, tinha a sensação de que as pessoas eram mais compreensivas, mais tolerantes, mais dispostas a conversar e, de certa forma, aceitar as diferenças dos outros.
Vejo o Coelho, o saudoso sociólogo Antônio Geraldo de Campos Coelho, um dos meus tipos inesquecíveis, abrigado detrás do balcão do Bar e Lanchonete Ponto Chic, discordar frontalmente da nossa visão de mundo - ele, um antimarxista extremado, nós, plenos de certezas com as convicções da juventude...
E discutíamos, apaixonadamente, sem que nenhum dos lados impusesse ao outro alguma palavra ofensiva, sem que houvesse resquício de ressentimento depois da cansativa refrega.
Discordávamos como discordam os homens civilizados - os copos de cerveja que tomávamos eram a nossa testemunha.
Não, a sociedade não era menos desigual que a de hoje - ao contrário, o fosso que separava os pobres dos ricos era ainda maior.
O que ocorria, não sei se pela educação que recebíamos em casa e na escola, é que pensávamos mais, refletíamos mais, nos informávamos mais - uma contradição em tempos sem a facilidade da internet...
E éramos, pelo menos aparentávamos ser, mais corteses e mais cordiais.
Retorno ao presente.
Dou uma espiada no Facebook, passo os olhos pelo Twitter.
E observo o ódio se espalhar, a intolerância aumentar, o preconceito crescer, a estupidez grassar e a violência dominar os corações - o brasileiro, parece, está em guerra contra seus próprios compatriotas, seus vizinhos, seus colegas de trabalho, seus amigos e seus familiares.
A minha porção racional tenta me tranquilizar - não julgue o todo pela parte, diz. É apenas uma minoria que está expondo suas frustrações, suas derrotas, seus fantasmas e seus traumas. Ela é barulhenta, mas não tem força para convencer ou influenciar os milhões que estão calados.
Antes fôssemos apenas razão...
Lá no fundo, no canto mais escondido do cérebro, a dúvida persiste - e se desta vez a emoção sobrepujar a razão?
É vero, prezado Motta. Também já passei dos 60, e vivo com a mesma perplexidade. No entanto não me conformo em ficar sem explicações. Minha experiência de vida, aponta para algumas respostas, que me parecem factiveis:- Capitalismo selvagem, com estímulo insano ao individualismo extremo.- Industria criminosa de armas e drogas. Exaustão dos recursos e do ambiente necessário a sobrevivência do homem.
ResponderExcluirBem, acho que só isso já é motivo suficiente para o caos. Porém tem mais. Mas vamos ficar por aqui, pra poder pelo menos conseguir dormir a noite. Abraço.
Reação de lactose transgênica, só pode!
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