A eleição de domingo foi, sem nenhuma dúvida, a mais desanimada das tantas de que participei - e foram muitas, pois o meu primeiro voto foi em 1974. Não vi uma bandeira sequer nas ruas, nenhuma manifestação de cabos eleitorais, nenhuma movimentação que me lembrasse que aquele era um dia especial, em que a gente tem a oportunidade de expressar o que deseja para a cidade, para o país em que vivemos. O fato é que a Justiça Eleitoral, com a proibição de fazer boca de urna, de entregar os santinhos, de cabalar os votos, estragou o clima de festa que a gente vivia num dia de eleição.
A apatia da população se expressou nos índices de votos em branco e nulos, que dobraram em São Paulo. E também na votação recebida pelo tucano José Serra, apoiado por um terço do eleitorado, que parece ter se esquecido que o ex-governador já rasgou, uma vez, a promessa de cumprir seu mandato por inteiro, algo, a julgar pela sua campanha, inteiramente alheia aos gravíssimos problemas da metrópole, pode perfeitamente se repetir se ele for eleito novamente. A impressão que tenho é que Serra é candidato a presidente e não a prefeito.
De qualquer modo, ninguém precisa ficar escutando as lorotas dos tais comentaristas e analistas políticos, esses que, meses atrás, haviam decretado a morte política de Lula e do PT, para entender como o paulistano votou no domingo. É só clicar nesse link para ter uma noção exata do que se passa na cabeça do eleitor de São Paulo: os 30% mais ricos votam em peso no candidato tucano ou assemelhado, os 30% mais pobres, no candidato do PT, seja lá qual for, o restante se divide entre os outros.
Nenhuma novidade nisso. Um alemão barbudo escreveu muito sobre esse fenômeno. E já faz tempo. Se não me engano, ele definia isso como expressão de uma tal de "luta de classes".
Nesse segundo turno, tudo indica, os votos desses 40% que não optaram nem por Serra nem por Haddad, devem se distribuir quase equitativamente, mas o candidato do PT, se as pesquisas desta vez estiveram certas, será mais beneficiado, por ter uma rejeição menor que o tucano.
As pesquisas, aliás, merecem um comentário à parte: longe de fazer parte daqueles que constroem teorias conspiratórias a todo instante, mas é impressionante como elas mais parecem chutes e desejos do que algo que tenha, ainda que remotamente, algum rigor científico.
E pensar que muitos eleitores dão tanta bola a elas, se descabelam e ficam desesperados quando os números são desfavoráveis aos seus candidatos.
Nessas horas o melhor remédio para o desânimo é aplicar a famosa "margem de erro", que conserta tudo, ou então cantarolar o belíssimo bolero de João Bosco e Aldir Blanc: "São dois pra lá, dois pra cá".
E tudo ficará como a gente quer.
O desabafo do guerrilheiro
Cena marcante na eleição paulistana foi o desabafo desesperado do ex-deputado e ex-presidente do PT José Genoino. Só quem não conhece absolutamente nada da história do Brasil, do que foi a luta contra a ditadura militar e dos percalços enfrentados pelas pessoas que fizeram oposição àquele regime infame, podese deleitar com o sofrimento do ex-guerrilheiro, ex-preso e ex-torturado político.
Os jornalistas que foram assediá-lo no momento de sua votação se comportaram mesmo como abutres, como pessoas sem nenhuma educação ou consideração com as dificuldades pelas quais Genoino passa hoje.
Ao comparar as dores físicas que seu corpo sofreu na ditadura com as que sua alma vem sofrendo agora, Genoino dá uma lição a todos nós que pretendemos ver este país um dia ser realmente grande e digno: a liberdade de imprensa não pode nunca ser usada para destruir reputações, como mero instrumento de vingança ou como artifício para a luta política.
O jornalismo é - ou deveria ser - algo completamente diferente.
Obrigada, mai uma vez Motta, por dizer com muita competência aquilo que eu quis dizer ontem em uma postagem no meu FB:"Gente, achei muita falta da festa! Nada de folhetos; nada de bandeiras; ninguém me abordou; ruas vazias... sério mesmo, não gostei! Nem parecia dia de festa da Democracia. Cumpri com o meu direito/dever cívico apenas com a emoção de ter votado em dois caras de caráter e garra Paulo Malerba e B A Vanderlei Victorino." (Minha postagem ontem às 12 horas.)eipelegrini@hotmail.com
ResponderExcluirMotta,
ResponderExcluirEsse ano achei que a indignação geral contra santinhos e cavaletes como "sujeira" na cidade demostra o pior sentimento apolítico generalizado: aquele que, apesar de despolitizado, se sente contestador. Herança da "geração CQC", julguei. Escrevi isso no facebook há algumas semanas e fui bombardeada de comentários contrários. Até hoje alguns amigos me mandar esse link como exemplo de que eu estava errada: http://eleicoes.uol.com.br/2012/album/2012/10/07/sujeira-de-campanha-invade-cidades-no-primeiro-turno.htm#fotoNav=36 Ainda acho que o argumento da sujeira é pífio - nada que uma ação especial dos lixeiros não resolva, como se faz em dias de feira-livre ou mesmo no carnaval. A única argumentação válida que recebi foi a que esse tipo de política dos santinhos ainda é muito precária do pós-ditadura, baseada na desinformação dos eleitores e de certa forma "coronelesca" - mais valeria outras formas de divulgação pelas ideias dos candidatos do que seu nome e número. Ainda não estou completamente convencida e gosto, sim, do clima do dia de eleição.